Swap Meet* in Tuba City
Minha recém-conquistada amiga Rebecca Black, índia navajo de Page (Arizona), aconselhara, "Para quem gosta de folclore e costumes, há 2 eventos imperdíveis na região: os primeiros dias do mês na Wal-Mart, a maior loja da cidade, onde a indiarada toda se pavoneia em trajes e jóías, torrando o salário do mês, e o mercado das sextas-feiras em Tuba City."
Infelizmente perdemos os primeiros, pois definitivamente era meio de mês.
Ao passo que uma bela manhã, num bar de uma Route que facilmente podia ser a 66, sorvendo o primeiro energy drink do dia, pergunto a meu parceiro:
"Que dia da semana é hoje?"
"Sexta-feira." - responde ele.
"Dia de mercado em Tuba City! Vamos lá?" - como se ele tivesse a chance de opinar...
100km e muita poeira depois, uma placa indica "Welcome to Tuba City", numa encruzilhada com posto de gasolina e umas casinhas perdidas nas dunas rosadas, varridas em todas as direções por dust devils (redemoinhos de areia finos e altos).
A cidade não tem praça, igreja ou prefeitura. Onde será o tal mercado? Perguntamos 2 ou 3 vezes, até alguém acusar, "É atrás do depósito de lixo: primeira à esquerda, segunda à direita etc." (como se os rastros dos carros que passaram na areia definissem ruas...)
Percursos diversos pelas dunas, avistamos finalmente algo que pode ser um depósito de lixo, um terreno grande e cercado. No canto em que fazem acrobacias diversos 4x4, ali deve ser a entrada.
"Estacionar" é relativo, visto que cada um pára como quer. Escolhemos 2 carros parados próximos um do outro para colocar nosso ao lado, pretensamente criando uma regra. Não consigo parar de rir ao descer do carro: é uma sauna com vento furioso que cobre a gente de poeira dos pés à cabeça!
Meu companheiro luta com chapéu voando, chaves caindo na areia, engolindo toda a poeira que Deus mandou.
Enterro meu chapéu-cowboy e óculos de sol na cabeça, dou graças que o filtro solar já secou - senão eu tinha virado uma milanesa... - e vou encarar.
Não se sabe se tudo está aberto ou fechado, as poucas pessoas quase não se mexem, todo o movimento fica por conta da paisagem. As mercadorias não são poucas, porém ensacoladas ou contidas em pequenas áreas, certamente para não voarem.
Tentando entender o que acontece, vou me aproximando aos poucos das tendas dos índios. Tirar a câmera do bolso? Nem pensar, vai encher de areia, vou acabar tendo que comprar uma nova.
Maravilhas sequer começa a descrever o que vejo: tapetes, jóias, pedras, artesanato. Tudo a troco de banana, quando não por atacado.
As índias velhas estão encasacadas até os gargomilhos - será que isso ajuda a refrescar?! O calor é indescritível, surreal, nunca dantes visto.
Compro tudo o que vejo pela frente sem pestanejar, afinal quando voltarei aqui? O dinheiro vai rápido, e obviamente ninguém aceita cartões de crédito, o que nos garante não uma, porém DUAS idas de carro ao caixa automático mais próximo (nem por isso fácil de achar).
Encerro a aventura convencendo uma calejada pele-vermelha, enrugada como se tivesse 200 anos (mas só tem 72) a me fazer um tapete de 200 dólares por 166, afinal é realmente tudo o que me sobrou. No que ela hesita e resmunga, mas acaba concordando.
*a expressão "swap meet" (encontro para trocas/comércio) provavelmente origina-se dos tempos do faroeste.
Guilherme
ReplyDeleteTexto maravilhoso! Vivenciei, senti a poeira entrando na minha boca, senti o calor tostando a minha pele branca. Vem cá? Avistou algum Sioux, Comanche ou Apache relativamente guapo? Beijos Areiosos - Chantal Jeanne